Afinal a vida foi,é...e será sempre um desafio na sequência sólida de percorrer caminhos que se ajustem à reflexão equilibrada e tolerante, onde os projetos nunca acabem, e se definam cada vez mais naquilo que queremos ser, e não no que os outros querem que nós sejamos...
Perceber que refletir e concluir são atos que não podem estar confinados apenas ao reflexo daquilo que experimentamos sozinhos, ou obcecadamente vemos nos outros,caindo assim na tentação de criar verdades absolutas agarradas a pressupostos com falta de equilíbrio identificativo da nossa própria vontade...
Não podemos nem devemos querer para os outros aquilo que foram momentos nossos,e ajustados apenas e só para nós próprios...
Fazer crescer é educar e tentar ser amigo,é procurar limar com valores acrescentados os passos próprios de uma imaturidade pela qual quando jovens naturalmente passamos,e ou se está bem atento,ou então ficamos apenas por nossa conta,e isso pode ser muito perigoso...
Sinto sinceramente que os "meus" me olham com a admiração de quem foi livre de escolher o seu próprio caminho,com responsabilidade e dispensando cópias comportamentais,mas entendendo que a partir de uma "base experimentada" também podemos ramificar genuinamente o nosso próprio"eu"...
Só se vive uma vez,e tirar originalidade a um ser,é limitar as emoções que estavam reservadas para cada um,e isso eu penso que não é justo...

Custódio Cruz

Aprender com a nossa sombra,e fixar os olhos em outras...

Aprender com a nossa sombra,e fixar os olhos em outras...
"...No dia em que me silenciarem a voz,não me apagarão os gestos,no dia em que me aniquilarem os gestos,nunca farão esquecer os meus sentimentos..." CustCruz

quinta-feira, 20 de junho de 2013

Um texto longo,triste e cheio de uma dor lancinante...




"Uma vida..."no futebol de formação,tanto me trouxe grandes momentos como enormes tristezas,mas foi na minha passagem pelo Grupo Desportivo de Buarcos,em que o pico de infelicidade me derrubou impiedosamente.
Perder e ganhar jogos,vencer e ser vencido nos campeonatos arrepiavam-me o estado dos meus sonhos,mas ver sucumbir à vida seres que sentia como filhos,como irmãos,ou nem sei o que diga,foram socos que esmagaram para sempre o meu bem estar pleno,que me feriram de uma dor lancinante a cada momento que revejo o meu passado de vida,de uma vida em que eles eram,e repito, parte de mim,e eu deles,numa família tão solidária quanto amiga uns dos outros.
Quis Deus(acredito eu...),ensinar-me a viver com o reverso da alegria,o Carramona,o Giróbia,o Raité,e depois o João Pedro Mascarenhas Bessa,todos abalaram fiéis no aviso que me fizeram,mas aos quais eu nunca me conformei,e tentei mudar o curso do destino.
Não consegui,e ainda hoje choro por vós.
Eu sabia tudo sobre os meus jogadores dentro e fora das quatro linhas,sobre algumas coisas fazia-lhes chegar orientações que os pudessem ajudar a eles,e ao nosso sonho de vencer.
O Carramona,o Giróbia e o Raité,tinham afinal de contas e só feito uma escapadinha àquela discoteca em Condeixa,fora de um fim de semana de jogo,e apenas para abanar o capacete e se insinuarem às ninas da cidade dos doutores.
No regresso à Figueira,com o Giróbia ao volante e sem idade para conduzir,foram bater com um carro,que vejam só,tinha como dono o proprietário da Discoteca de onde vinham,e foi mesmo isso que fez este senhor  dispensar a Polícia, e acreditar nestes adolescentes,que no fim de semana seguinte lá iriam pagar os estragos que por suas culpas tinham proporcionado ao patrão da "Disco" das preferências. 
Pois é,só que nesse fim de semana seguinte,havia jogo,e o Carramona chegou-se junto a mim no treino de sexta-feira,contou-me o sucedido fora das minhas exigências comportamentais,mas pediu-me para os autorizar a irem de novo a Condeixa pagar a dívida.
Depois de me arrepiar com as incidências do acidente,depois de saber que tinham um amigo maior de idade que era o dono do carro,de os advertir de forma dura sobre o comportamento e inconsciência naquela aventura inadvertida,respirei fundo e segui em frente perante os seus rostos cabisbaixos.
Perguntei de uma vez,e então onde estava o dinheiro para o fazer?
O número dez chamou o cinco,e explicaram os dois que o Raité que já andava ao mar tinha ganho uns trocos,e que iriam agora servir para tapar o buraco inconsciente,e que depois fariam contas os três em altura mais propícia.
Lá os autorizei,no compromisso de me telefonarem assim que chegassem,e de forma instintiva e protectora,aconselhei-os que desta feita fossem os dois para o banco de trás.
Bem,o certo é que eu não sabia o que dizer para os trazer de volta para junto de nós,e saí-me com aquela solução tão pouco consistente.
Ao outro dia o telefone não tocou,resolvi ir ao Café Epanema jogar flipers,passado um pouco,bateram-me nas costas,era o capitão António Carlos que me dizia que o seu pai e nosso director de categoria me queria falar,que estava parado com o seu carro ao pé da Bijou à minha espera,o número 3 estava com o rosto muito fechado mas contido,quando lá cheguei,o senhor António pediu-me para entrar no carro e logo arrancou em movimento,olhei para ele e verifiquei que só olhava em frente.
Voltei a perguntar,mas afinal o que se passa?
De forma o mais calma possível,me tentou explicar que o Carramona,o Giróbia e o Raité,tinham cumprido o pagamento ao dono da discoteca de Condeixa,mas que...
Senti um frio enorme na barriga,as lágrimas invadiram-me as faces,o senhor António disse-me que estavam no Hospital dos Covões em Coimbra,que o acidente foi contra uma carrinha funerária,e que me tinha que preparar para algo de mau.
Numa réstia de esperança,pedi-lhe que fosse imediatamente para Coimbra comigo,ao que ele prontamente anuiu,pelo caminho foi me contando a história,e até me disse que também comigo estavam a cumprir a palavra,mas que o embate frontal tinha sido logo em Santa Clara, e numa lomba complicada,mais à frente,e já íamos nós em Montemor,deu-me a conhecer que o Giróbia e o Carramona tinha sido os últimos a dizer adeus à vida,que iam no banco de trás,e que foi muito difícil aos bombeiros fazer o resgate dos seus corpos.
Começou a chover,e ainda hoje ouço os pára brisas do carro do senhor António a marcar o compasso da minha tristeza,do meu desespero,e perante o silêncio que me apagou a voz,e me deixou sozinho junto de dois amigos e elementos de mais esta família do futebol CNC.
Chegámos aos Covões,e não me deixaram ver os meus rapazolas,regressámos a casa,e fechei-me no meu quarto até ao dia do funeral,daquele dia de uma dor que jamais esquecerei.
O tempo passou,e o terror não haveria de nos deixar em paz,já depois do "gigante" Pedro Bessa rumar à União de Coimbra,vinha eu do cemitério de Buarcos onde fui visitar as campas dos seus companheiros de equipa no clube dos "taraus",estava ele sentado junto às muralhas de cabeça caída e exausto no fisíco.
Parei,e perguntei-lhe o que se passava?
Respondeu,que nada...Mister...só estava cansado.
Sorriu e levantou,falou um pouco comigo e abalou para casa logo de seguida.
Estranhei,com os meus jogadores quem acabava as conversas era eu, e não eles,não porque eu quisesse,mas porque acontecia...
Passado pouco tempo,e porque o verão estava a chegar,pedi-lhe que fizesse parte de uma equipa que iria levar a competir nos torneios de futebol de salão nos Caras Direitas,aceitou a sorrir,e como sempre chamou-me "pequenito",dando-me um abraço de contentamento pela escolha.
Iria ser dos mais utilizados,e por isso entrou logo no "primeiro no cinco" do primeiro treino no Pavilhão do Ciclo,passado poucos minutos pediu-me para sair,e logo a seguir para entrar,de repente para sair de novo...e depois para experimentar mais uma vez...
As minhas desconfianças transformaram-se em receios pouco definidos,mas preocupantes,alertei-o para ir ao médico,o que fez logo ao outro dia.
Também ao outro dia e logo de manhã,estava eu no Mercado a abrir a minha banca, de costas para a banca da Dª Saudade,ouvi uma senhora lamentar que um rapaz da sua terra tinha ido ao médico e lhe tinham diagnosticado leucemia,que era jovem,forte e parecia vender saúde.
Virei-me para a senhora e perguntei-lhe de quem estava a falar,ao que me respondeu que era de um rapazinho de Buarcos,que jogava futebol,e que se chamava Pedro Bessa.
As minhas pernas tremeram,fechei de novo o meu negócio,corri para sua casa onde encontrei um corrupio choroso,falei com a família,e a partir daquele dia jamais o larguei em viagens consecutivas e diárias entre Coimbra e Figueira,e só mesmo quando foi para França fazer o transplante, o deixei de ver,apoiar e animar numa luta tão difícil de vencer...
Chegou um dia e perdeu-a,fui a uma capelinha de Buarcos e despedi-me perante o seu corpo consumido de sofrimento,voltei a "cair no poço",como também voltei a não me conformar com uma das regras mais elementares da vida.
No Futebol tive muitas alegrias,mas também aprendi o quanto a vida vale tanto enquanto quem gostamos está perto de nós.
Até um dia rapazes,e não arranjem nenhum treinador no céu,porque tudo farei para também um dia a aí chegar...

Custódio Cruz